Pesquisas sobre o diagnóstico e o tratamento do Transtorno do Espectro Autista (TEA) movimentam o cenário científico dentro e fora do Brasil. Popularmente chamada de autismo, a condição é caracterizada por sintomas nas áreas de interação social, comunicação e um padrão de comportamentos ou interesses restritos e repetitivos.
Segundo especialistas, o espectro é amplo e, por isso, exige abordagens personalizadas e eficazes.
— Temos que ler estudos publicados toda semana, porque estão saindo coisas novas. O mundo inteiro pesquisa sobre o autismo e tenta desenvolver novas terapias e novos testes diagnósticos — afirma Simone Sudbrack, professora da Escola de Medicina da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS).
O diagnóstico do autismo é clínico. Ou seja, é feito com base na observação e análise dos comportamentos do paciente. Questionários, como o MCHAT, podem ajudar na coleta de informações relevantes para identificar o transtorno. Ainda assim, inovações tentam simplificar esse processo e diminuir o risco de diagnósticos incorretos.
Carlos Gadia, neuropediatra especializado em TEA que atua nos Estados Unidos há mais de 40 anos, conta que o psicólogo brasileiro Ami Klin está prestes a mudar esse padrão:
— Foi aprovada, em setembro do ano passado, uma técnica, que agora é reconhecida pelo Food and Drug Administration (FDA) - órgão semelhante à Anvisa nos Estados Unidos -, de diagnóstico de crianças entre 16 e 30 meses de idade, baseada unicamente no foco ocular — explica Gadia.
O exame, segundo ele, consiste na apresentação de uma série de vídeos para o paciente. Um computador rastreia 120 vezes por segundo cada tomada do vídeo para ver onde o olhar está sendo focado.
Os achados são, então, comparados com o rastreamento ocular de crianças típicas – sem o transtorno – da mesma idade. A partir disso, é possível fazer um diagnóstico em minutos. Para ele, a inovação pode ajudar a agilizar a identificação do TEA em crianças.
Já Simone cita uma inovação que pode ajudar a aumentar a precisão do diagnóstico, auxiliando a parte observacional. Trata-se de um algoritmo desenvolvido recentemente por pesquisadores brasileiros e alemães.
— Através da função do cérebro, do desenho da sinapse, o algoritmo compara um cérebro típico e um atípico. Os pesquisadores conseguiram mapear cérebros de mais de 200 pessoas com comportamento típico e atípico. Crianças, adolescentes e adultos. E, usando esse algoritmo na ressonância funcional, eles conseguem ver que há diferenças e, então, auxiliar no diagnóstico.
O tratamento do TEA é outra área que recebe bastante atenção dos pesquisadores e especialistas. Entre as novidades disponíveis, a professora da PUCRS chama atenção para um novo tipo de terapia chamada Floortime (tempo no chão, em tradução livre).
— É uma terapia que incentiva os interesses da criança para expandir as oportunidades de comunicação ou de interação social. As atividades envolvem o interesse e as habilidades da criança, então é ela quem vai direcionando a terapia. Ainda precisa ser mais aplicada e estudada no Brasil, mas tem um grande poder de transformar — acrescenta.
Com outra proposta, Gadia destaca uma medicação que não tem o objetivo de tratar os sintomas do TEA, mas sim desligar genes que podem causar doenças. Ele cita o Trofinetide, um remédio aprovado pela FDA em março do ano passado para o tratamento da Síndrome de Rett, que, segundo o especialista, está associada ao autismo.
— Todas essas novidades mudam aquela ideia de que “infelizmente, não tem nada a fazer, essa criança não vai ser nada na vida”. Poder mudar isso, para algo que ainda está muito longe, abre uma janela de esperança de que, quem sabe, a história vai ser diferente. Isso é uma das coisas mais mágicas.
As novidades no tratamento e diagnóstico de autismo serão debatidas no Autism Safe Journey – Follow the Science (Jornada Segura do Autismo – Siga a Ciência), simpósio sobre o tema que ocorre nesta sexta (8) e sábado (9) em Fort Lauderdale, na Flórida, nos Estados Unidos. Gadia é um dos organizadores do evento, que tem como objetivo reunir pesquisadores, especialistas e famílias dentro do TEA para trocar informações.
— Estamos vivendo uma situação no mundo inteiro, em que existe, ao contrário de 30 anos atrás, muita informação sobre o autismo. Infelizmente, nem sempre essa informação é de qualidade. Fica difícil para as famílias, e, às vezes, até para os próprios terapeutas ou profissionais de saúde e educação que não têm tanta experiência, distinguir o que é de qualidade e o que não é — pontua o neuropediatra.
No ano passado, a primeira edição, com o tema Dia Global do Autismo, contou com profissionais e famílias dos Estados Unidos, do Brasil, de Portugal e da Angola. Neste ano, presenças internacionais também estão confirmadas.