Há semanas, o governo federal prepara o anúncio de um pacote de corte de gastos. O objetivo da medida é equilibrar as contas, restringindo o crescimento das despesas para que se adequem às receitas. Após alguns adiamentos, o pacote pode ser anunciado ainda nessa semana.
O arcabouço fiscal, que define a política fiscal do governo, impõe limites para os gastos: não podem subir mais do que 2,5% ao ano acima da inflação nem ultrapassar 70% do aumento da receita. Para equilibrar essa conta e respeitar essa regra na prática, o governo anunciará uma série de restrições nos gastos previstos de alguns ministérios.
Para efetivar os cortes, o governo pretende enviar ao Congresso uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC), além de um projeto de lei complementar. O aumento de gastos acima do previsto no arcabouço reduz o espaço para investimentos e dificulta o financiamento da máquina pública como um todo.
O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, já tomou uma série de medidas com objetivo de aumentar a arrecadação do governo. Diminuiu isenções tributárias, retomou cobrança de impostos, regulamentou atividades econômicas. As iniciativas ampliaram o volume de recursos e fontes de receita nos cofres da União, mas não foram suficientes para equilibrar as contas.
— O que está se discutindo nesse momento é o orçamento primário, que leva em consideração a receita menos os gastos, e o saldo desse orçamento está deficitário. Por isso, o governo precisa trazer para um equilíbrio, ou seja, ou reduz os gastos, ou aumenta as receitas. Então, a ideia do corte de gastos é alinhar com alguns ministérios em termos dos recursos que eles têm para redução das despesas e tentar chegar mais próximo do equilíbrio desse orçamento — explica Lisiane Fonseca da Silva, economista e professora da Universidade Feevale.
Em busca desse equilíbrio, Haddad lidera a campanha de convencimento de seus pares sobre a importância dos cortes, mesmo sofrendo resistência de alas do próprio governo e do Partido dos Trabalhadores (PT). O ministro da Casa Civil, Rui Costa, também está encarregado das articulações internas.
Entre os ministérios que deverão ser impactados pelo pacote estão pastas como Previdência, Desenvolvimento Social, Trabalho e Emprego, Saúde e Educação — os líderes destes ministérios já tiveram reuniões com Haddad, Rui Costa e Lula. Alguns destes, como Luiz Marinho (Trabalho), Carlos Lupi (Previdência) e Wellington Dias (Desenvolvimento Social) estavam entre os mais resistentes ao pacote, mas acabaram convencidos.
Wellington Dias afirmou, na manhã da segunda-feira (11), que o governo está buscando dar um recado de "eficiência" no equilíbrio fiscal ao mercado financeiro, também com a revisão de programas como Bolsa Família e Benefício de Prestação Continuada (BPC). Segundo Dias, essa revisão resultará em uma economia de R$ 2 bilhões por parte de sua pasta em 2025.
— Em 2023, nós abrimos o ano com uma previsão de gastos de R$ 175 bilhões para o Bolsa Família e fechamos o ano com R$ 168 bilhões. Este ano vamos fechar com R$ 166 bilhões, aproximadamente — afirmou, atribuindo a economia ao aumento do emprego e ao combate a fraudes.
No início desta semana, Haddad informou que Lula tinha pedido a inclusão de mais um ministério, o que novamente adiou em alguns dias o anúncio. Na noite de terça, o Ministério da Fazenda confirmou tratar-se da pasta da Defesa.
Somando a restrição imposta em todos os ministérios, especialistas acreditam que o pacote pode chegar a um valor entre R$ 30 bilhões e R$ 50 bilhões nos orçamentos de 2025 e 2026, quando acaba a atual gestão do governo federal.
— Se o número vai ser R$ 30 bilhões, R$ 40 bilhões ou R$ 50 bilhões, talvez não seja o mais relevante. O mais relevante é saber o quanto desse ajuste fiscal será permanente, ou seja, o quanto vai ao longo dos anos impactar o endividamento público — observa o economista-chefe do Banco Pine, Cristiano Oliveira.
As tratativas para o anúncio do pacote já estão na terceira semana. Antes do anúncio oficial, o presidente Lula deseja apresentar as propostas aos presidentes da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), e do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), pois o pacote contém medidas legislativas, que precisam de apoio para aprovação no Congresso.
Na segunda-feira, Haddad declarou acreditar que a PEC tem chances de ser aprovada ainda este ano, apesar da tramitação longa de propostas do tipo. O ministro também ressaltou a importância do corte de gastos obrigatórios em melhorar a qualidade dos gastos públicos, reduzir a inflação e permitir o crescimento sustentável da economia.
— Aquela diretriz que nós anunciamos desde o começo desse processo de fortalecer o arcabouço fiscal, de trazer para dentro do arcabouço fiscal aquilo que eventualmente não estiver se comportando da maneira como nós esperamos, é para consolidar essa transição. De um regime de déficit elevado e baixo crescimento para um regime de equilíbrio fiscal com crescimento sustentável — comentou o ministro da Fazenda.