Há cerca de cinco meses, uma quantidade excessiva de chuva começava a atingir o Rio Grande do Sul, trazendo um grande volume de água que, em maio, extravasaria sistemas de proteção contra cheias e inundaria Porto Alegre e diversos municípios da Região Metropolitana. Desde então, foram anunciadas obras de recuperação e reforço para estas estruturas, e apesar de os trabalhos já terem iniciado de forma emergencial em determinados pontos, a grande maioria dos projetos ainda está em fase de estruturação e preparação.
Após a tragédia climática de maio, o poder público definiu a reparação e a melhoria dos sistemas de contenção de cheias dos municípios gaúchos como uma prioridade no processo de recuperação do Estado. Os investimentos e projetos executados com este objetivo compõem uma das áreas de monitoramento do Painel da Reconstrução, desenvolvido pelo Grupo RBS, e a chuva que causou alagamentos em cidades como Porto Alegre nesta quinta-feira (26) reforça esta necessidade.
Na última semana, o governador Eduardo Leite foi a Brasília assinar um termo de cooperação com o governo federal, oficializando a gestão integrada com o Executivo estadual para a administração e execução das principais obras estruturantes nos sistemas de proteção contra cheias em Porto Alegre e nas cidades da Região Metropolitana. A União deve realizar um aporte de R$ 6,5 bilhões em um fundo, a ser criado e totalmente preenchido até dezembro, para viabilizar estes investimentos, que vão beneficiar 38 municípios — a portaria nº 710 da Casa Civil, que oficializou a criação do Conselho de Monitoramento das Ações e Obras para Reconstrução do Rio Grande do Sul, foi publicada no dia 18 deste mês.
Estão previstos para execução com esta verba, em diferentes etapas, projetos de proteção contra cheias em quatro locais principais:
Destes, conforme informações da secretaria da Reconstrução Gaúcha (Serg) e a secretaria de Desenvolvimento Urbano e Metropolitano (Sedur), que têm seus secretários no conselho de governança em parceria com o governo federal, os planejamentos de Eldorado do Sul e do Arroio Feijó são os mais adiantados.
Mesmo assim, estão ainda em etapa de elaboração e contratação de projetos de engenharia, com previsão para ser concluída entre o final deste ano e o primeiro semestre de 2025. O prazo das obras, apontam as secretarias, deverá ser definido conforme os projetos e cronogramas contratados, sem previsão atual. Ao todo, o governo federal projeta um período de até cinco anos para adequação completa dos sistemas de proteção contra cheias da região.
Nas obras para controle de cheias do Rio Gravataí e do Arroio Feijó, entre a zona norte de Porto Alegre e Alvorada, é projetado um investimento de até R$ 2,5 bilhões. Cerca de R$ 4,4 milhões já foram desembolsados para fases anteriores de planejamento da obra, como para anteprojeto de engenharia e estudos de impacto ambiental. Para a execução das obras de contenção contra cheias do delta do Jacuí em Eldorado do Sul, a projeção é de até R$ 531 milhões, sendo que cerca de R$ 2,3 milhões já foram gastos nas etapas prévias.
Já os projetos da bacia do Rio dos Sinos e da bacia do Rio Gravataí ainda estão finalizando a etapa de estudo e relatório de impacto ambiental, aguardando aprovação da Fundação Estadual de Proteção Ambiental (Fepam) para iniciar os projetos executivos e posterior realização das obras.
As obras na bacia do Rio dos Sinos podem chegar a R$ 1,9 bilhão, beneficiando os municípios de Canoas, Esteio, Sapucaia do Sul, Nova Santa Rita, Rolante, Novo Hamburgo, Campo Bom, São Leopoldo, Igrejinha e Três Coroas. Cerca de R$ 6,7 milhões já foram gastos com os estudos e relatórios necessários.
O projeto da bacia do Rio Gravataí, que beneficia os municípios de Porto Alegre, Alvorada, Viamão, Gravataí e Cachoeirinha, tem investimento previsto de até R$ 450 milhões, com cerca de R$ 5 milhões já aplicados nas etapas anteriores.
— É um recurso bastante volumoso, mas necessário para realizar essas medidas estruturais. São necessários porque, infelizmente, nossas cidades ocupam áreas muito suscetíveis a sofrer inundações. Agora que construímos cidades nessas áreas, devemos protegê-las com o reforço dessas estruturas de proteção contra cheias, como são os diques e os demais componentes complementares — comenta o hidrólogo Fernando Fan, do Instituto de Pesquisas Hidráulicas da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS).
Investimentos anunciados no âmbito do Novo PAC Seleções, do governo federal, incluem cerca de R$ 770 milhões em cinco projetos de macrodrenagem urbana em Porto Alegre. Em complemento, o Dmae e a prefeitura se movimentam para realizar intervenções emergenciais no sistema de proteção contra cheias da Capital.
Em 30 de agosto, o órgão iniciou trabalhos de reparos emergenciais nos diques externos da Fiergs e do Sarandi, superados pela água em maio passado. No primeiro momento, o trabalho objetiva nivelar a proteção em 5m50cm, como previsto no seu projeto original, mas nunca concretizado — até a enchente, tinha trechos com altura de até 4m50cm.
No dique do Sarandi, segundo o Dmae, os trabalhos visam a elevação da altura de proteção onde necessário e a impermeabilização dos pontos com fuga de água, além de melhorias nos acessos. Para estes reparos emergenciais nos dois diques, o Dmae projeta investimento somado de R$ 10 milhões, de seus próprios recursos, e conclusão em até seis meses após o início dos trabalhos.
Além disso, a instituição também estuda a necessidade de ampliar ainda mais a altura da proteção nos dois locais, ação que necessitaria de recursos do governo federal ou mesmo contratação de financiamento com instituições bancárias.
— Só com a complementação da altura dos diques de acordo com o previsto no projeto original, as estruturas já teriam funcionado para proteger das inundações que aconteceram em maio. De qualquer forma, vamos ainda continuar estudando para ver se há necessidade de aumentar ainda mais, visando a possíveis novos eventos climáticos extremos futuros — aponta o diretor-geral adjunto do Dmae, Darcy Nunes dos Santos.
A prefeitura também estuda reforçar o sistema de comportas — sete das atuais 14 deverão ser totalmente concretadas, e as remanescentes melhoradas —, com a contratação de uma consultoria especializada, desembolsando R$ 245 mil, além de proteger as casas de bombas da Capital. Intervenções como elevação de painéis eletrônicos e de subestações elétricas e instalação de bombas submersíveis, que devem ocorrer em 18 das 23 Ebaps e que iniciaram neste mês, também envolvem recursos próprios e de possíveis financiamentos externos.
Em Canoas, a obra de reforço do dique de proteção contra cheias no bairro Mathias Velho, um dos mais afetados pela enchente de maio, começou em 16 de setembro. Os trabalhos no local buscarão inicialmente reestabelecer a estrutura de 5m50cm, e depois elevar a cota de proteção até 7m. Com prazo de conclusão em até 14 meses, a empresa Eurovia Construtora LTDA, de Novo Hamburgo, venceu o edital com valor de R$ 68,5 milhões pelo serviço.
A prefeitura também informa que já iniciou obras de reparo no dique Rio Branco, de continuidade no dique Niterói, e de construção do dique no bairro Mato Grande, além de outras ações de reforço do sistema de proteção contra cheias no município.
Como investimento total em todas as obras listadas, a administração municipal projeta gastos de cerca de R$ 1 bilhão, pretendendo receber R$ 990 milhões do governo federal e R$ 50 milhões do governo estadual. Até o momento, contudo, os recursos que estão sendo investidos nas obras, na ordem de R$ 50 milhões, são próprios do município.
Em São Leopoldo, a primeira obra executada pela prefeitura foi a recomposição emergencial de trechos dos diques nos bairros Vicentina e Vila Brás, também superados pela água durante a enchente de maio — as estruturas também estão sendo elevadas em 50 centímetros em comparação ao que era antes da inundação, de 6m40cm para 6m90cm, e poderão ser ainda mais ampliadas, dependendo de estudos que estão sendo realizados. O investimento inicial é de R$ 9 milhões, provenientes do governo federal.
O município também conta com a chegada de recursos federais para aumento dos diques do centro da cidade e para a construção de um dique no bairro Feitoria, orçado em R$ 93 milhões. Ainda estão previstas a construção de novas estações de tratamento de esgotos e casas de bombas na cidade, além de outras ações de reforço no sistema de contenção de cheias.
Em Novo Hamburgo, a prefeitura já executou, com recursos próprios, reparos emergenciais para recomposição de trechos do dique do Rio dos Sinos. Ainda com recursos do município, uma empresa foi contratada para realizar estudos para possíveis novas obras de elevação de nível.
A prefeitura também aguarda a liberação de recursos do governo federal para a construção da bacia de detenção do Arroio Luiz Rau, no bairro Rincão, com projeto orçado em R$ 21 milhões. Além disso, espera também a liberação de R$ 18 milhões para a construção de um dique no loteamento da Integração, no bairro Lomba Grande.
— Com a criação do conselho de gestão de projetos de obras de modernização e construção dos sistemas de contenção contra cheias, geridos em conjunto pelo governo do Estado e a União, espero que os investimentos em todo o sistema do dique na bacia do Rio dos Sinos sejam acelerados, incluindo um laudo técnico de toda a sua extensão, pois é inadmissível a demora com que estão tratando um assunto tão grave — reforça a prefeita de Novo Hamburgo, Fátima Daudt.